Dizer adeus atualmente é uma das coisas mais difíceis que temos que aprender a fazer, seja crianças ou adultos. A modernidade tornou os momentos de despedida um tabu tão grande que ninguém mais fala sobre ele. Vivemos como se não perdêssemos nada e não pudéssemos perder, por mais que convivamos com os mais diversos tipos de perda em nosso cotidiano. O não dito sobre as perdas faz com que cortejemo-las de forma sútil: falamos sobre elas nos jornais, nas músicas, nas histórias que contamos, nos medos que não compartilhamos, mas demonstramos com vários problemas de saúde e de apego.
Não nos é ensinado "dizer adeus" e quando chegamos frente a frente com o inevitável da morte - a perda que nunca terá volta em nossas vidas - ficamos meio que sem palavras, meio atordoados e tentamos evitar, segurando as lembranças do morto o máximo possível.
No entanto, é impossível continuar vivendo sem se despedir, sem abrir espaço para o novo. É preciso abandonar as lembranças e deixa-las em seu devido lugar de lembrança. É preciso abrir mão. Mas, como podemos fazer isso?
A música "não aprendi a dizer adeus" do compositor Joel Marques e imortalizada pela voz do cantor sertanejo Leonardo é uma música que nos faz refletir sobre o não saber dizer adeus e ter que dizer adeus. Ela parece ter sido escrita com o compositor ao pé de um caixão em um velório. Vejam bem se ela não imortaliza os sentimentos de despedida que antecedem o momento de enterro:
Não aprendi dizer adeus
Não sei se vou me acostumar
Olhando assim nos olhos teus
Sei que vai ficar nos meus
A marca desse olhar
Ouvindo a música mais atentamente é possível se imaginar em pé a um caixão, olhando pela última vez o rosto do ente querido, uma lembrança que para sempre ficará marcada na história. Os olhos que não mais brilham e respondem. Os olhos do vazio e do mistério da vida e da morte que sempre está a nos questionar como estamos vivendo.
Sutilmente, os sentimentos do ouvinte vão sendo levados para o inexplicável de perder um ente querido e ter que se despedir: "Não tenho nada pra dizer / Só o silêncio vai falar por mim". É difícil encontrar as palavras para a despedida e, às vezes, realmente não há mais nada a se dizer.
O compositor pouco a pouco vai retratando a ideia de que está dor estará sempre com aquele que ainda vive e que ela necessita ser um tanto esquecida em prol do amor que foi construído durante a relação: "Eu sei guardar a minha dor / Apesar de tanto amor vai ser / Melhor assim". Ele fala já no fim da música sobre a aceitação da perda, apesar do amor e da dor. Ele traz um pouco de esperança de que por fim o tempo vai passar e as cicatrizes serão esquecidas:
Não aprendi dizer adeus mas
Tenho que aceitar que amores
Vem e vão são aves de Verão
Se tens que me deixar que seja
Então feliz
Não aprendi dizer adeus
Mas deixo você ir sem lágrimas
No olhar, se adeus me machucar
O inverno vai passar, e apaga a cicatriz
Esta música é uma dentre tantas outras que pode ser utilizada como estratégia de enfrentamento para enlutados. A sonoridade e a letra da música nos aproximam dos sentimentos que não conseguimos nomear e ajuda na reflexão que em certo grau todos passam pela mesma dor.
Não é tão difícil assim se despedir ou falar da morte se assim como crianças pudermos utilizar de formas lúdicas que não joguem tão "na lata" os nossos sentimentos. Quando não encontramos palavras para expressar a dor, podemos encontrar símbolos que exprimam a angústia e o sofrimento que corre por dentro. Podemos utilizar da arte para dar um novo significado a história que já não pode mais ser e encontrar uma nova história para contar. Fica a dica!
- Publicado originalmente no site da Agenda Saúde: http://www.agendasaude.net/2016/02/nao-aprendi-dizer-adeus.html