segunda-feira, 20 de abril de 2015

Sobre pais...




[...] Um dia, quando tinha dois anos, ela (Wendy) estava brincando no jardim e, depois de colher mais uma flor, correu para junto de sua mãe. Acho que devia estar linda, pois a sra. Darling levou a mão ao coração e exclamou: “Ah! Se você ficasse assim para sempre!”. Foi tudo o que aconteceu entre elas em relação a esse assunto, mas a partir daí Wendy soube que teria de crescer. A gente sempre sabe, quando tem dois anos. Dois é o começo do fim.
(Barrie, 1999, p.7)



Adoro essa citação do livro do James Barrie, Peter Pan e Wendy, ela é singela e sábia: a Sra. Darling, mãe da Wendy, sabia que não poderia manter a filha para sempre com dois anos, onde ela ainda seria aquela fofurinha de bebê que faz várias travessuras e todo mundo acha engraçado e bonitinho porquê é um bebêzinho que está explorando o mundo e ainda possui a tal ingenuidade infantil.



Os pais precisam saber que as crianças não vão ser sempre essas coisas fofas que eles tanto amam e precisam aceitar que de vez em quando vão sentir muita raiva e talvez até mesmo desejar que elas não tivessem existido, e o mais importante, que os seus filhos também irão ama-los e odiá-los. Ah! E claro, eles irão dar trabalho! Muito trabalho! Crianças não são bonecos, que a gente coloca em um canto e eles ficam. Eles irão gritar, conversar, bagunçar, pular, fazer coisas erradas, fazer coisas certas, lhe irritar, lhe dar carinho e mais um monte de coisas que os próprios pais também fazem em suas relações.


Pois bem, escuto os pais que chegam ao consultório queixando-se que seus filhos estão agressivos, chatos, abusados, respondões, e que eles não aguentam mais, estão cansados, perdidos e já tentaram de tudo, não fazem mais ideia do que fazer. Pergunto a idade das crianças e eles me respondem, sérios: três, quatro, cinco anos... Oi??? Fico me perguntando como é que uma criança de três anos de idade consegue bater em um adulto que tem praticamente o terço do seu tamanho? Mas, acontece...


Começamos a conversar e eles falam o quanto é diferente a educação e o respeito que eles possuíam com seus pais, com a que seus filhos possuem por eles. Eles não se comparam aos seus pais, mas lembram-se de como eram como filhos. Levando em conta que algumas lembranças são uma mescla do que vivenciamos e do que escutamos as outras pessoas falando sobre nós, vai saber o que os pais realmente achavam ou como eles se sentiam na época. O que mudou? Será que as tapas e castigos físicos faziam tanta diferença assim? Será que eram os gritos? Ou o espaço para brincadeiras?


Ok! Ok! Admito! A vida mudou muito... mas também não é pra tanto.


Se vocês me perguntarem o que eu acho, eu vou lhes dizer, de uma pessoa que não tem filhos, observa de longe e, sem querer me gabar, mas que as crianças adoram, o que falta são elementos muito simples: Atenção, Paciência, Respeito e Compreensão!


Não só dos pais para com seus filhos, ou dos seus filhos para com seus pais, mas inclusive de si para consigo mesmo.


Vejam bem, é preciso ter compreensão para com todos os envolvidos. Os pais estão exaustos dos seus próprios trabalhos e possuem os seus próprios problemas emocionais, muitas vezes devido a relacionamentos no trabalho, com os parceiros e por aí a fora. Os filhos estão cansados de ficar sozinhos, de passarem o dia todo assistindo os mesmos vídeos, de fazer atividades de escola, ou simplesmente de sempre ouvirem não: "Não podem fazer isso, não podem fazer aquilo! Não posso prestar atenção em você agora, espere um pouco, estou trabalhando"!


Tic... Tac.. Tic... Tac...


O tempo está passando e assim como o jacaré que fica atrás do Capitão Gancho para conseguir um pouco mais de naco da carne do capitão, assim o tempo está atrás desses pais e desses filhos...


Tic... Tac... Tic... Tac...


Compreensão de que o tempo passa, as crianças crescem e o tempo não volta atrás. Compreensão para entender que cada um tem sua forma de viver e suas prioridades. Então, chegamos ao respeito, pois as crianças também possuem suas prioridades, suas necessidades, que vão tornando-se diferentes a medida que vão crescendo.


Paciência para aprender a esperar e fazer com que os tempos convirjam para um mesmo ponto: o da atenção para com o cuidado e carinho que todos merecem. Essa atenção deve vir dos próprios pais, pois a criança precisa aprender a esperar e se os pais não lhe ensinarem isso, a vida vai ensinar de forma mais difícil quando estiverem mais velho.


Os pais precisam de tempo para si, como sujeitos que possuem sua própria individualidade e do seu tempo de solidão, do tempo de casal - para que o par parental não sucumba as adversidades do dia a dia - e, precisam entender que necessitam de tempo para encontrarem sua forma de serem pais e por isso, precisam prestar atenção no que sentem para entenderem a si e aos seus filhos. Ou seja, muita atenção aos seus próprios sentimentos e necessidades.


Até porque é tanta informação de como fazer e de como agir que noto que eles tornaram-se meio maluquinhos, sabe? "Faço o que minha mãe disse? Ela criou não sei quantos... Ou será, melhor fazer como o marido disse... Ai, e a reportagem que eu vi na televisão... Ai, meu deus, a psicóloga disse para que eu fizesse assim"...


Só que no dia a dia, na hora "H", é você e apenas você, sua forma de ser, que irá dizer como você agirá naquele momento. É a sua essência, aquilo que você é e como você reage aos testes que a vida impõe que irá oferecer uma resposta e um exemplo ao seu filho.


Então, é o que peço aos pais de crianças tão pequenas que ainda possuem sua moral e ética em formação para pensarem: qual o exemplo que você está dando ao seu filho? Quer que seu filho seja amoroso, gentil e paciente? Observe-se! Você também é assim? Você também é amoroso, gentil e paciente para com eles? Pois, um fruto nunca caí longe da árvore. E, crianças pequenas... Bem... Elas ainda são pequenas... Ah! E são crianças, não bonecos, que não se mexem, não falam, não pensam e não possui vontade.








domingo, 12 de abril de 2015

Caminhada pela Conscientização do Autismo em Garanhuns - 11 de Abril

No dia 02 de Abril todo o mundo ficou azul. Luzes azuis foram acesas, roupas azuis foram tiradas do guarda roupa e desfiladas pelas ruas, tudo isso para chamar a atenção da população para a causa das crianças autistas.

Há algum tempo essas crianças viviam à margem de nossa sociedade. Elas existiam, claro! Mas, estavam escondidas em suas casas, em quartos, algumas vezes até amarradas. Eram tidas como loucas, deficientes... Eram esquecidas... Seus pais não sabiam muito bem o que fazer com elas, pois não havia voz, não havia olhar, não havia interação da parte delas, existia agressividade, gestos estranhos, como andar na ponta dos pés, ou ficar girando e girando, balançando as mãos, fixação por determinados objetos, a utilização das mãos dos pais ou de qualquer outra pessoa como se fosse um objeto. Eram tidas como estranhas, mal educadas, incontroláveis e por isso mesmo eram guardadas a sete chaves. Eram um estigma para toda a família. 

Era assim em Garanhuns, interior de Pernambuco, era assim em muitos outros locais e para muitas outras famílias. No entanto, como é bom observar a mudança que lentamente está ocorrendo e a busca pela melhoria da qualidade de vida e das interações destas crianças. 

Em Garanhuns, do dia 02 ao dia 11 de Abril do corrente ano, houve a Semana do Autismo, uma semana para conscientizar e abrir os olhos da sociedade para estas crianças e seus familiares. Organizada e encabeçada por uma mãe que luta por seu filho e seus direitos, que luta por outras mães e outras crianças, a semana é organizada para que a população receba panfletos informando sobre o que é o autismo e flores azuis entregues no primeiro e último dia da ação. A organizadora percorre as escolas explicando, clareando e informando pais e professores sobre estas crianças e a vida do cuidador de um anjo, como muitas crianças com autismo e outras deficiências são chamadas.

A semana ocorre há cinco anos, já a caminhada estava em seu segundo ano. No, entanto, achei muito interessante observar que quase metade dos caminhantes eram de cidades vizinhas, que vieram apoiar a causa; assim como a quantidade de professores e agentes da educação que marcaram sua presença, além é claro, de alguns pais e familiares destas crianças e, inclusive, algumas dessas crianças. Senti falta dos profissionais da área de saúde, pois além da educação, estas crianças também precisam do suporte que os psicólogos, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais,  pediatras, neuropediatras, podem oferecer. Não só na assistência diária, dando suporte e buscando soluções para os problemas físicos e emocionais que estas crianças possuem como também na luta pelos direitos e igualdade frente a sociedade. Um diálogo entre todos aqueles que cuidam destas crianças quando não se encontram dentro de uma mesma instituição é deverás complicado de conseguir com todos ocupados com suas agendas individuais e deveres da vida diária, mas é complicado e não utópico. Espero que este espaço para o diálogo possa ser aberto em breve dentro da cidade de Garanhuns.

Assim como é de extrema importância que estes cuidadores também possam ser cuidados, ouvidos e apoiados em sua lida. Lembramos sempre de falar daqueles que necessitam dos cuidados imediatos, mas se os cuidadores não forem cuidados, chegará uma hora que eles estarão cansados, desanimados, exaustos e terão dificuldades em conciliar o crescimento de suas próprias vidas e seus deveres de cuidadores e então, eles também adoecerão. 

A caminhada demonstrou o quanto estas pessoas podem se unir, o quanto elas podem provocar a sociedade, ao passar com suas blusas azuis e distribuir suas flores azuis, seu carro de som chamando e dando bom dia, debaixo do sol quente, quase uma hora de caminhada, por ruas importantes da cidade. Portanto, que mais uniões possam ser feitas, pois o apoio, o braço a braço ajuda a construir um mundo melhor, ajuda a suportar e superar os desafios da vida. Que as uniões possam ser feitas não apenas no dia 02 de abril ou em uma semana do autismo, mas que ela seja feita todos os dias, todas as horas, por todos nós!

Deixo os meus parabéns a organizadora, Rennata Amorim e a sua equipe que lhe sustentou, ajudou e apoiou durante o evento.

Alguns momentos:


segunda-feira, 6 de abril de 2015

O lugar da perda

Perder algo ou alguém é uma das experiências mais frustrantes na vida de qualquer pessoa, pois com a perda nos deparamos com nossas limitações, nossa fragilidade, nossa impotência diante do ciclo da vida.

Nunca paramos para pensar que sempre estamos perdendo algo, do mais simples como os cabelos, a epiderme, as unhas, bijuterias, sapatos, roupas, móveis, livros, a comida e a água que ingerimos também possui uma parte que é perdida, não sendo aproveitada pelo organismo, até as mais complexas, como a perda de amigos ou familiares por brigas, ou a perda definitiva que ocorre com a morte de entes queridos, inclusive, animais de estimação. Perder é simplesmente algo que acontece na vida.

No entanto, o vazio que fica ao se perder algo ou alguém necessita ser delimitado, escutado, olhado,
para que não consuma aquele que o sente, principalmente nos casos de morte física,  a morte real, concreta. 

As pessoas brincam dizendo que só damos valor ao que temos quando perdemos e muitas vezes é isso que ocorre mesmo. Porém, se desde pequenos pensássemos a vida como algo frágil e que pode ser perdido a qualquer momento, sem avisos, talvez pudéssemos  valorizar o tempo que temos com as pessoas. Mas o ser humano, este ser que acredita em sua invencibilidade, onde tudo pode acontecer com os outros, mas não de sua porta para dentro e que sempre existe tempo... Sempre deixa para depois as mudanças que poderiam ser feitas hoje!

Aí, o que ocorre? Lá vem a dona morte dizendo "oh, gurizada, não ouviram o Einstein? O tempo é relativo". E, ela mexe com toda a nossa adaptação, coloca nossas crenças e ideias de cabeça para baixo. Ela nos surpreende e nos faz pensar e repensar nossas prioridades, como organizamos nosso tempo, como nos relacionamos. Isso é! Quando a gente consegue pensar sobre isso... porque em boa parte a surpresa e a dor é tão grande que embota os sentidos, as emoções... aqueles que perderam apenas fitam o vazio e sentem a saudade que avassala, a saudade que não pode ser "matada"" e as lembranças... ou as reminiscências, de como as coisas poderiam ter sido. 

Em uma época onde ser feliz a todo custo é primordial, aqueles que carregam dentro de si a tristeza  e a incontestável certeza de que não podem mais modificar o passado, de que não existe mais tempo, tornam-se excluídos e são enxotados para deixarem para trás sua dor e esquecer a morte e aquela pessoa que partiu.

E, aí? Como fica? Como ficam essas pessoas sem o espaço de elaborar os sentimentos de impotência, o sentimento de fragilidade, a culpa e a saudade?

Elas adoecem! Claro! Tudo que precisa ser engolido e digerido a força (leia-se e entenda que falo dos sentimentos) acaba voltando como doença.

É preciso lembrar que a morte faz parte da vida, ou seria a vida que faz parte da morte? E que é preciso ter cuidado, carinho e acolher essas pessoas que sentem tão profundamente e possuem imensa dificuldade em deixar seus entes queridos partirem. Seja dentro de sua própria família, círculo de amizades, ou de forma mais geral na sociedade e nos ambientes da área de saúde.

Portanto, o lugar da perda, da morte é o de poder olhar para a vida de outra forma e talvez, aprender com a morte como valorizar e aproveitar muito mais a vida!

Fica a dica! 


quarta-feira, 1 de abril de 2015

Autismo - Por uma conscientização

http://www.dicasmiudas.com.br/02-de-abril-dia-mundial-do-autismo/

Faz 08 anos, amanhã, que o dia 02 de abril foi escolhido pela Organização das Nações Unidas (ONU) como dia mundial pela conscientização do autismo. Pois, apesar de ser um diagnóstico teoricamente conhecido desde a década de 40, ainda existe muita desinformação, confusão e estranhamento frente ao trato com essas crianças, seja dentro de casa, nas escolas ou na própria área de saúde.

O nome já foi modificado diversas vezes: Autismo, Transtorno Global do Desenvolvimento, Transtorno do Espectro Autista... Virou "quase" uma salada de sintomas e comportamentos que deixam pais, médicos, psicólogos, professores, fonoaudiólogos e terapeutas ocupacionais, louquinhos! Os nomes modificam-se devido às novas formas de pensar e observar este fenômeno, e a cada vez que o nome aumenta mais crianças acabam sendo enquadradas no tal "diagnóstico".

Hoje, estima-se que uma em cada 68 crianças possua autismo ou esteja enquadrada no dito espectro autista, dentre estas, a cada cinco, quatro são meninos. É algo alarmante e preocupante, principalmente se não for algo realmente conhecido. 

A conscientização serve para alertar e fazer com que estas crianças cheguem mais cedo aos consultórios médicos, psicológicos, fonoaudiólogos e dos terapeutas ocupacionais. É o que as pessoas da área de saúde chamam de intervenção precoce. Quanto mais cedo a criança chegar aos serviços, mais fácil será ajudá-la a encontrar um comportamento, digamos, "mais funcional", ou seja, mais fácil enquadrá-la na nossa normalidade social. 

Quando os pais chegam ao meu consultório, sinto-os, muitas vezes confusos, com medo e com a ideia de que terão que tomar conta daquela criança e abdicar de suas vidas (principalmente as mães) "para sempre". É um trabalho enorme fazer com que essas mães e esses familiares encontrem espaço para eles mesmos. Além de necessitar de muito cuidado e atenção, pois muitas vezes, essas crianças não possuem ideia do perigo que correm ao fazer determinadas coisas, é difícil encontrar pessoas dispostas a ajudar estes familiares no cuidado com essas crianças.

Ou seja, o não olhar, o não interagir, torna estas crianças alheias ao mundo em que vivem devido à incapacidade que muitas vezes temos de sair de nossos próprios mundos e crenças para adentrar na vivência do outro.

Ao lidar com crianças ditas autistas, precisamos lembrar que elas são humanas, são crianças e necessitam de cuidados e carinhos como qualquer um de nós. Costumo dizer aos pais: "esqueçam por um momento o diagnóstico, lembre que é uma criança, necessita de limites, necessita de seu olhar" e o que os pais, e qualquer um que travar conhecimento com ela, necessitará fazer é aprender a entrar no mundo dela, respeitando os limites, para pouco a pouco compartilhar o nosso mundo com ela e talvez, criar novas formas de vir a ser nesse mundo.

Existe muito mais a ser explorado e a ser falado sobre este assunto. Mas por hoje é só! Que fique a mensagem de que para conhecer este transtorno é preciso olhar para além do sintoma, conscientizar-se que existe um ser a se construir, bem ali, por trás de todas aquelas esquisitices. Mas afinal, quem não tem a sua esquisitice?!

Até a próxima!!